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Puro Swing do Anhembi! Conheçam Rafaella Rocha, a Mestra!

Puro Swing do Anhembi! Conheçam Rafaella Rocha, a Mestra!

Data de Publicação: 27 de agosto de 2020 00:29:00

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Por Victória Teixeira – Colunista da Revista Feras.

Trazendo esperança para mulheres ritmistas, a mestra de bateria da Imperatriz da Paulicéia, conta sua trajetória até chegar ao ponto máximo entre batuqueiros. Dificilmente encontramos mestras de bateria, até arrisco dizer que, atualmente, é a única mulher de São Paulo. Com muita musicalidade, liderança e sabedoria, apresento-lhes, Rafa Rocha;

Revista Feras: 

- Quem é Rafaella Rocha?

Rafa Rocha: 

- Rafaella Rocha é uma mulher de 31 anos, formada em Educação Física, estudante de música na EMESP Tom Jobim e Mestra de Bateria da Swing da Paulicéia, da escola de samba Imperatriz da Paulicéia. Difícil falar da gente na terceira pessoa, né? 

Revista Feras:

- Como entrou pro carnaval, qual sua escola? 

Rafa Rocha: 

- Desde pequena eu moro na famosa “Av. Nova”, o mesmo endereço da escola de samba X-9 Paulistana. Desde pequena acompanhava do portão os ensaios de rua da X-9 e essa vontade cresceu junto comigo. Aos 17 para 18 anos eu pedi aos meus pais para ingressar na escola, coisa que não era possível antes, pois a visão dos meus pais em relação ao carnaval não era muito positiva. 

A X-9 Paulistana me formou como ritmista e também como diretora de bateria. Passei por instrumentos como caixa, surdo de terceira, e tamborim em desfile; e toquei os outros instrumentos em shows e escolinhas para auxiliar os novos ritmistas. O surdo de terceira foi quem me trouxe quase tudo que tenho hoje em dia e foi nele que me consagrei diretora de bateria em 2016 para o carnaval de 2017, após 9 anos tocando no carnaval. Além da bateria, ocupei e fundei alguns departamentos como o Departamento Jovem e o Departamento Cultural.

Revista Feras: 

- Você como mulher, estando a frente dos ritmistas da bateria tem alguma dificuldade com isso? Qual é a sua relação com o pessoal da sua bateria?

Rafa Rocha: 

- Hoje em dia não tenho dificuldades com a bateria, como também não tinha com meus ritmistas da ala de terceira da X-9, mas isso é fruto de um trabalho de formação de ritmistas e, principalmente, de respeito. Não é uma posição fácil e já passei por muito preconceito para chegar até aqui. Sinto que ajudei a abrir muitas portas para as mulheres que querem ocupar uma posição dentro de uma bateria, desde tocar a ser mestre; e é exatamente para isso que eu bati tanto a cabeça, porque as facilidades que encontrei no caminho foram resultado da briga de outras mulheres que ocuparam esses espaços (que hoje pude ocupar, como próprio cargo de diretora de bateria).

Revista Feras:

- Conte um pouco da sua escola, como você chegou ao cargo que você se encontra hoje?

Rafa Rocha: 

- A paixão chamada “Imperatriz da Paulicéia” é um pouco mais antiga do que essa nova passagem pela escola. Tudo começou em 2014, para o carnaval de 2015, quando o Intérprete Fabiano Melodia, que também fazia parte do time de canto da X-9 Paulistana, acreditou em mim e me indicou ao cargo. Além da confiança por trabalharmos juntos, o interesse surgiu devido a uma oportunidade que o Mestre Adamastor me concedeu no carnaval de 2014, quando me permitiu fazer a montagem de times de show e, muitas vezes, a chance de ficar à frente da bateria. 

Após o desfile (e, graças a Deus, a nota máxima), eu foquei apenas no meu trabalho na X-9, auxiliando o Mestre Vitor da Candelária e, posteriormente, na diretoria de bateria para o carnaval 2017, depois do convite dos Mestres Fábio e Kito. Em 2019, a Imperatriz estava sob nova administração e o interesse pelo meu nome surgiu novamente. 

Conversei com a diretoria da escola, e projeto deles para a agremiação não me deixou dúvidas na hora de aceitar a composição do time. Desde então, estamos juntos em busca do tricampeonato.

Revista Feras: 

- Qual sua preparação para um dia ensaio e pro dia do desfile oficial? 

Rafa Rocha: 

- Eu acredito que todo ensaio tem um peso importante (não só os técnicos ou os últimos ensaios) e sou BEM chata com presença e trabalho. Gosto de tudo muito organizado, alinhado, e procuro sempre ritmistas dedicados e que respeitem a ideia de trabalho. Da mesma forma que cobro bastante, acredito que a bateria deve ser uma via de mão dupla: do mesmo jeito que busco resultado, espero que a pessoa esteja realizada em estar aqui, e tento proporcionar as melhores condições possíveis; que o horário seja cumprido, que sempre tenha um instrumento afinado, talabarte e baquetas organizados, etc. Isso, claro, sem falar do astral no ensaio, que é imprescindível. 

Por isso dia de ensaio é sim mais corrido que os demais (e normalmente não janto), porque apesar do ensaio ser 20h, eu normalmente estou na quadra pelo menos 1h antes (e já na correria). 

Já no desfile a ansiedade toma conta. Tento me alimentar da melhor forma, mas confesso que é um dia difícil de manter uma ‘’organização’’. Acho que principalmente por ser uma pessoa que quer estar a par de tudo, eu acabo ‘’sofrendo’’ com possíveis problemas que surgem durante o dia. 

Em todo o processo de carnaval, não só no dia, eu estou em dia com a minha fé. No dia não saio de casa sem a minha guia e sem ter me preparado espiritualmente antes. Afinal, se você não fez as coisas direitinho durante o ano, não adianta pedir milagres no dia.

Revista Feras: 

- Sobre o carnaval de hoje, você acha que ele se perdeu em algum momento ou se hoje ele está com mais força que ele tinha antigamente? Você mudaria algo nele?

Rafa Rocha: 

- O Carnaval de fato mudou, não há como negar! O carnaval se tornou mais técnico e, consequentemente, mais ‘’enrijecido’’; não se brinca mais na avenida como antigamente e erros são fatais para o trabalho de um ano (apresentado em 65 min). Exatamente por isso o trabalho precisa ser cada vez mais técnico, árduo e com pessoas dispostas a respeitar isso. Acredito que também seja por isso que tantas pessoas migraram para o carnaval de rua e hoje “não tem pavilhão”. Quando entrei no carnaval era mais fácil achar pessoas que estavam ali pelo pavilhão, mas continuo acreditando que um trabalho sério, com respeito e em busca de resultado forma novos amantes de uma agremiação.

Revista Feras: - Uma inspiração.

Rafa Rocha: 

- Inspiração é algo que sempre me enrolo pra falar pois construí minhas características num grande ‘’pouquinho de cada um’’. Inspirações femininas levo comigo sempre três nomes: Talita Badia, Tamara Santana e Silvanny Sivuca, que foram e ainda são exemplos de musicalidade, responsabilidade e astral a frente de suas alas e trabalhos. Não posso deixar de citar, porém, o Mestre Adamastor, Mestre Vitor da Candelária, Mestre Fábio e Kito, Mestre Serginho, Mestre Moleza e Mestre Zoinho. Carrego comigo um pouco de cada um deles, além de muita gratidão a todas as oportunidades que me deram.

Revista Feras: 

- O que você está fazendo nesses tempos de pandemia?

Rafa Rocha: 

- Confesso que a pandemia me fez trabalhar mais. Com medo da cabeça ficar ruim e o espaço de tempo atrapalhar os trabalhos futuramente, eu trabalhei bastante em cima das tecnologias, como lives e redes sociais. Acredito que todos tiveram de se reinventar e comigo não foi diferente: fizemos várias lives sobre bateria no canal que faço parte, o Ritmista.com; e na Swing da Paulicéia eu trouxe uma série de lives com exercícios de percepção rítmica, ministradas por professores renomados de percussão, e outras sobre os naipes que compõe a bateria, com uma referência por naipe (que escolhi a dedo e tive o prazer de contar com todos de quem fui atrás). 

 

Usamos as redes sociais da bateria também para ajudar algumas pessoas, através de dois quadros: Laços com Nina e Classificados. Conseguimos, em um, anunciar e ajudar pessoas com suas empresas, serviços, compras, vendas e doações; no outro, abordar assuntos de saúde mental (que foi o segundo grande problema dessa pandemia).

 

Por fim, estamos iniciando nossos ensaios online. Fizemos a entrega de baquetas (via drive-thru) e desenvolvemos, em parceria com a Contemporânea, um linha de estudos (que inclusive só tenho a agradecer, por sempre trazer a melhor qualidade para quem toca, e por todo o apoio que me deram nesse projeto).

 

Revista Feras: 

 

- E sobre o que está acontecendo com o mundo agora, a violência policial, racismo escancarado, o fascismo... O que aconteceu no mundo para que chegássemos a esse ponto. O que uma opinião feminina tem a nos dizer sobre todo o caos que acontece hoje no mundo inteiro.

 

Rafa Rocha: 

 

- O momento atual é muito delicado e triste, muitas questões à flor da pele. É importante, no entanto, que entendamos que essas não são apenas questões da atualidade. Racismo estrutural, violência policial, machismo… São questões-problema há décadas, fruto de uma cultura errada e desumana. Bato muito nessa tecla no dia a dia, porque existe muita luta ainda a ser travada. Claro que ainda estou aprendendo, desconstruindo coisas em mim e nas minhas vivências; mas acredito muito no poder do diálogo e na força que as lições diárias podem nos trazer. Forço bastante que as pessoas vejam a representatividade de gênero que temos na bateria, a importância do enredo para 2021 (o Bloco Ilú Obá de Min)... são coisas pequenas no todo, mas sei que de alguma forma afetam quem trabalha comigo. Não dá pra perder a esperança num amanhã mais humano. 

 

Fotos: Mulheres no ritmo, Arquivo pessoal.

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